É engraçado como surpresas ocorrem em nossas vidas, quando menos esperamos. Toda sexta feira eu me divirto com alguns velhos amigos, alugando um estúdio e ensaiando com nossa bandavelhos hits dos anos 80.
Ontem, curiosamente chegamos diante do estúdio, e nada.
Portas fechadas.
Parece que a falta de comunicação entre a banda e o dono do estúdio, causou grande frustração em todos nós. Não tivemos ensaio.
Ficamos algum tempo elaborando a situação, até finalmente decidirmos fazer alguma coisa de útil, ao invés de ficarmos plantados na calçada, cercado por travestis que circundam a avenida Indianópolis.
- Vamos em algum barzinho comer alguma coisa – Disse um deles.
Confesso que eu e minha mulher estávamos cansados, mais propensos em voltar para casa e nos largarmos diante da TV com nossos gatinhos.
Mas de repente, surgiu na minha cabeça um certo lugar que há algum tempo havia despertado minha curiosidade. Uma certa pizzaria totalmente bairrista, no centro do meu querido bairro planalto paulista.
Logo, eu acabei sugerindo este lugar, na verdade por um bom motivo:
Escutara há algum tempo atrás, através de outra pessoa, que alguns amigos que não via há muito, colegas de um velho bar no meio do planalto, infelizmente extinto, conhecido pelo nome de seu velho e querido proprietário Diogo, freqüentavam esta pizzaria.
Daí, meu desejo em ir até lá na esperança de encontrar alguns destes velhos amigos, em especial o querido e bom Chico.
Não dá pra falar do Chico sem citar o que era o velho bar da Paula, ou melhor, o bar do Diogo.
Um senhor italiano forte, rabugento e maravilhoso que possuía um bar com grades fechadas em meio ao Planalto.
Somente conhecidos é quem podiam entrar.
Desconhecidos no bar, só com uma boa carta de apresentação.
Sua única garçonete, a Paula, que na verdade não se chamava Paula, mas poucos sabiam disso, era bastante desbocada, brincalhona, e com alguma idade avançada.
A Maria, cozinheira do lugar, também de idade, passava as noites fazendo seus deliciosos pasteis, e assistindo a novela ao lado do Diogo.
E assim, o querido e velho bar do Diogo abrigou inúmeros moradores da região, inclusive eu, durante anos. Reduto de amigos diversos que se divertiam com aquele trio inesquecível e atrapalhado.
Passei a freqüentar o Diogo em 1988 com alguns amigos, e diria que não deixei mais de ir até a morte de um deles, meu querido companheiro de boteco, talvez o único que de fato curtia de verdade o bar da Paula, como chamávamos, meu saudoso Titi.
Mas onde entra o Chico nisso tudo? Pois bem...
No inicio dos anos 80, eu e o Titi fundamos o Mephisto, nossa banda de heavy metal que infelizmente, contrariando todos os nossos planos, não se tornou tão famosa quanto o Iron Maiden, assim como acreditávamos que um dia se tornaria.
Começamos a compor nossas próprias músicas, até que um belo dia, o Denis, nosso vocalista comentou sobre um certo amigo seu que escrevia muitas letras, poemas, etc.
Lá fui eu e o Denis visitar seu colega, em busca de letras para musicarmos.
Conheci o Chico desta maneira.
O cara recitando um monte de letras românticas, brincando e fazendo piadas, irreverente e simpático, nos recebendo de braços abertos.
A banda terminou antes que pudéssemos de fato usar uma de suas letras, e nunca mais encontrei aquele cara divertido e criativo.
Pois bem, voltando ao bar da Paula em 1988, lá estava o Chico.
Relembramos o passado, e durante todos aqueles anos posteriores regados a pastel e cerveja, nos tornamos amigos. E através deles, novos e bons amigos surgiram.
Lembro-me dele me chamar de “garotinho’, sempre me chamando pra sentar-se à mesa dele, mesmo que estivesse esperando alguém.
Uma pessoa calorosa e amiga.
Presenciei momentos duros em sua vida e momentos alegres, como por exemplo, seu casamento.
Após alguns anos freqüentando o velho e bom bar do Diogo na companhia de amigos maravilhosos, uma tragédia tomou conta da minha vida. A morte inesperada do meu querido e bom companheiro Titi.
Deixei de aparecer no bar do Diogo durante um tempo, devido à dor daquela perda.
Aquele bar talvez tenha sido o lugar que eu e o Titi mais freqüentamos juntos, trocando idéias, filosofando sobre a vida, etc, e após sua morte, precisei de um tempo para conseguir voltar ao velho reduto.
Certo dia, quando finalmente resolvi retornar ao bar do Diogo, pronto para reencontrar amigos como o Chico, a Paula, o Diogo e a Maria, me deparei com as portas fechadas. E logo numa sexta feira.
Ainda me lembro quando o guarda da rua disse:
- O bar fechou há alguns meses com a morte do velho.
Voltei pra casa abalado.
Nova perda.
Um capítulo da minha vida ia junto com aquele bar.
Lembro-me naquele momento, de ter pensado no velho amigo Chico.
Depois de quase dez anos tomando cerveja juntos, eu não tinha um contato seu.
Sabia que morava no Planalto, mas não exatamente onde.
O tempo passou, até a noticia recente de que algumas destas pessoas, freqüentadores do extinto bar do Diogo, continuavam a se encontrar nesta pizzaria no centro do Planalto Paulista.
De cara, pensei no Chico. Quem sabe ele estaria por lá.
E assim, ontem, ao entrar na Pizzaria acompanhado pela minha mulher e meus amigos, quem é que eu vejo logo de cara?
Meu querido amigo Chico.
Confesso que me emocionei ao reencontrá-lo, e sei que foi recíproco.
O abraço que ele me deu foi tão forte e carinhoso, que naquele momento, percebi que tanto eu, como ele, reencontrava lembranças adormecidas.
Um reencontro do garotinho com o amigo mais velho.
Um reencontro com o bar da Paula, o Diogo, a Maria, o André, o Titi e tantos outros que se divertiram e choraram durante anos e anos, numa segunda, terça, quarta, quinta, sexta, sábado e domingo, em meio à cerveja e pastel.
O velho e bom Chico esta de volta, e agora, sei onde encontrá-lo.
Um maravilhoso capítulo da minha historia de vida, esta gravada na pessoa do Chico, e posso dizer que ontem, eu reencontrei algo que estava em algum lugar no meu coração, escondido há muito, aguardando o momento feliz do reencontro.
O velho e querido Chico.
sexta-feira, 28 de maio de 2010
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